Pedra
onde foi amarrada a barca do Apóstolo Santiago
Perdão
“Então
lhe disse o pai: Filho, tu sempre estás comigo, e tudo o que é meu é teu. Era,
porém, necessário que houvesse banquete e festim, pois que este teu irmão era
morto, e reviveu. Tinha-se perdido e achou-se”.
Parábola
do Filho Pródigo”, em Lucas 15:11-32.
Mito jacobeo
Aparentemente
tranquila por ter apenas 18,3 quilômetros, a etapa entre Caldas de Reis e
Padrón, na peregrinação pelo Caminho Português a Santiago de Compostela, exigiu
quase seis horas para ser vencida, não só devido ao cansaço, que aumentou, mas
também pela vontade de permanecer caminhando... Tudo leva a crer que
amanhã, terça-feira 15, estarei em Santiago de Compostela – nem imagino a
hora... –, após completar a décima etapa do Caminho, desde Oporto, no domingo, 6 de junho.
Com tempo bom,
iniciei a etapa ao atravessar a Ponte de Bermaña, que cruza o rio do mesmo nome,
no centro de Caldas de Reis. Logo o Caminho começa a subir, em meio aos
tradicionais bosques galegos, para alcançar 135 metros de altitude o pueblo de Carracedo,
onde de longe é possível avistar a torre barroca da Igreja de Santa Mariña.
A partir deste ponto o Caminho começa a descer e o sol brilha, deixando a paisagem ainda mais esplêndida,
na travessia de videiras, áreas de cultivo diversos e pequenos bosques. Não há
sinais de hordas de peregrinos, o que atribuo ao fato de ser segunda-feira e muitos
preferem o Caminho aos finais de semana... Reencontro apenas Ernest e Helmut, os
dois peregrinos austríacos que conheci no café da manhã em Caldas de Reis, e
peço para um deles me fotografar. Também faço foto da dupla.
Sigo meu
Caminho e, após atravessar o pueblo de San Miguel de Valga, chego a
Pontecesures, onde descanso diante da Igreja de San Julián. Estou apenas a três
quilômetros de Padrón. Na saída de Pontecesures há opção de deixar a rota tradicional
e ir ao Convento de São Francisco de Herbón, onde o albergue oferece hospitalidade
franciscana. Apesar da singela tentação, opto por conhecer ainda mais a extraordinária
Padrón, cujo nome deriva da pedra onde foi presa a barca que no século I trouxe
o corpo do Apóstolo Santiago à Península Ibérica, e que está sob o altar da
Igreja de Santiago de Padrón.
Atravesso a
ponte medieval sobre o rio Ulla, que integra a ría de Arousa, e fico sabendo
que ali existiu um importante porto romano e que pesquisas arqueológicas descobriram
cerâmica e moedas romanas desde Tibério, 14–37 d.C., até Constantino III,
407–411. Mais: que mestre Mateo, conhecido pelo magnífico Pórtico da Glória da
Catedral de Santiago, trabalhou em melhorias da antiga ponte de pedra.
Sigo para a
vila de Padrón e conforme já havia decidido não ficarei em albergue. Escolho a Pension
R. Jardin, uma construção de pedra do século XVIII, com excelente localização
para iniciar amanhã a etapa final – que terá 23,6
quilômetros e poderá ser peregrinada em torno de cinco horas e meia. Ou seja, tudo
indica que não chegarei a tempo de participar da missa dos peregrinos e assistir
ao botafumeiro, às 12 horas.
Tudo bem,
irei no dia seguinte. Mas, com certeza, chegarei disposto a dar um forte abraço
na imagem do Apóstolo Santiago que fica no altar da Catedral e aproveitar o dia
para conhecer mais as pessoas e os edifícios da Cidade Santa, considerando que
no ano passado cheguei num sábado, em meio a uma movimentada feira medieval, e já
no dia seguinte segui para Finisterre, sem tempo para investigar os tesouros jacobeos.
Como estou
em Padrón, no menu peregrino do dia degusto os internacionalmente famosos pimentos,
cultivados em Hebrón. De sabor intenso, o ditado popular galego alerta que pode
ser muito ou pouco picante: “Coma os pementos de Padrón: uns pican e outros non”. Padrón é emblemática na mitologia jacobea, pois foi em Padrón que ancorou a
barca com o corpo do Apóstolo Santiago Maior, vinda de Jaffa, na Palestina.
Santiago foi
decapitado no ano 44 d.C. por ordem do rei Herodes Agripa I, e os discípulos de
Santiago atravessaram o Mediterrâneo e a Costa Atlântica Peninsular, visando
enterrá-lo na região onde o Apóstolo pregou em vida, a chamada Translatio! A barca entrou pela ría
de Arousa, aportou às margens do rio Sar, perto de onde está hoje a Igreja de
Santiago, e os discípulos carregaram o corpo até o monte Libredón, atual
Compostela, para consumar o sepultamento.
A pedra
original onde a barca foi amarrada, que dá nome à vila, se encontra sob o altar
maior da Igreja de Santiago, cujo edifício atual é do século XIX, embora o primeiro templo date de 924. Ao visitá-la, a encontro repleta de
turistas. Afinal, estamos comemorando Xacobeo2010, Ano Santo Compostelano. Aguardo
um momento mais tranquilo e me aproximo da relíquia, que possui uma inscrição com
tradução incerta, “No ori eses osp”, e um anagrama de Cristo gravado posteriormente. Junto há uma placa com frases em latim:
“Cippus, cui nomen Petronum adest. Ei navim S. Jacob Zebedae Corporis.
Vectricem alligatam fuisse. Pie creditur”.
É acreditar,
ou acreditar!
Buen Camino!
#pedrasdocaminho
#10yearchallenge
Ponte
de Bermaña: três arcos de meio ponto, com dupla inclinação
Subindo
para Carracedo a 135 metros de altitude
Depois
de chuvas contínuas, sol iluminou o Caminho
Segunda-feira,
presença reduzida de peregrinos
Igreja
de Santa Mariña de Carracedo: torre barroca
Videiras
e outras plantações ao longo do Caminho
Descendo
para San Miguel de Valgae Pontecesures
Peregrino
no Caminho Português
Peregrinos
austríacos, Ernest e Helmut
Igreja
de San Julián e cemitério em Pontecesures
Ponte
medieval sobre o rio Ulla, que integra a ría de Arousa
Encenação
da chegada do Apóstolo na ría de Arousa e Ulla
Placa
explica tradição da pedra onde a barca do Apóstolo foi amarrada
Pedra
está sob o altar da Igreja de Santiago em Padrón
Santiago
Matamouros na Igreja de Santiago
Turistas
celebram o mito jacobeo na Igreja de Santiago
Fachada lateral da Igreja de Santiago em Padrón
Ponte
medieval sobre o rio Sar, junto à Igreja de Santiago
Rio
Sar é usado para a prática de esportes náuticos
Monumento
ao carro galego, de tração animal, às margens do rio Sar
Nenhum comentário:
Postar um comentário