sexta-feira, 14 de junho de 2019

Fé!


Celebração de Corpus Christi em Santo Domingo de la Calzada

Alguns trechos das ruas apertadas de Santo Domingo de la Calzada foram decorados com tapetes de pétalas de rosa, destacando os 900 anos de história da cidade... Final do nono dia de peregrinação pelo Caminho Francês, desde Nájera, que completei nesta data, há 10 anos...
#10yearchallenge
#pedrasdocaminho
#xacobeo2021

O texto abaixo foi publicado no primeiro livro da trilogia Pedras do Caminho: Meu Encontro no Caminho de Santiago!

SANTOS, IGREJAS, MILAGRES...

A presença católica marca as cidades do Caminho de Santiago com seus templos e edificações, alguns mais simples, outros majestosos – e culminará na Catedral de Santiago de Compostela. Dedicada ao apóstolo Santiago Maior, ela data de 1128 e tem estilo românico, com elementos posteriores, renascentistas e barrocos.
É a nova igreja em homenagem a Santiago, pois a primeira, do século IX, foi construída pelo rei Alfonso II, o Casto de Astúrias, e o bispo Teodomiro. Depois, no final do mesmo século, Alfonso III, o Grande, construiu uma basílica muito mais bela, destruída em 997 por Mohammed ben Abdelah Abuamie, o Almansor, vizir muçulmano de Al-Andalus.
Após Fernando III vencer os muçulmanos em 1236, a catedral fui reconstruída por Alfonso V. Uma parte da igreja foi consagrada em 1105 e o restante em 1211. Não que a presença católica seja uma novidade, muito pelo contrário, pois é o grande mote do Caminho e serve para consolidar a fé como forte elemento de motivação à grande maioria dos peregrinos.
Tal presença, pois – ao lado das belas paisagens, povo alegre e peregrinos bem dispostos – é a grande característica do Caminho, pelo menos até agora, neste domingo 14, dia de Corpus Christi, ao chegar a Santo Domingo de la Calzada, Província de La Rioja, e completar minha nona etapa, desde que sai sábado, 6 de junho, de Saint Jean Pied de Port, na França – acumulando 209,1 quilômetros a pé...
No domingo passado, ao chegar a Zubiri (completando a segunda etapa, vindo de Roncevalles), fui surpreendido com uma procissão que anunciava a semana de Corpus Christi na pequena comunidade navarra. A saída foi da praça da cidade, tendo à frente meninas vestidas de branco angelical, jogando pétalas de rosas, seguidas pelo padre e fiéis.
Já em Santo Domingo de la Calzada, em alguns trechos das ruas apertadas da cidade foram confeccionados tapetes de pétalas de rosa, entre outros elementos, destacando os 900 anos de história da cidade – de 1109 a 2009 – e já projetando, em banners distribuídos em pontos estratégicos, as comemorações do ano jubilar em 2010. Ou seja, quando o dia do apóstolo Tiago Maior, 25 de junho, cai no domingo, e a Igreja Católica espera levar algo em torno de 6 milhões de fiéis à Santiago de Compostela – muitos deles peregrinos! Às 12 horas teve início a missa festiva com a catedral lotada, mas nenhum fiel deixou de ver a celebração, fosse diretamente, ou por meio de telas de LCD espalhadas pelo templo. O edifício é exemplo de transição entre o românico e o gótico e teve sua condição de catedral celebrada em 1232, quando a cidade foi nomeada sede episcopal.
A igreja românica começou a ser construída em 1158 e atualmente conserva grande parte da antiga planta. No século XVI, parte do cruzeiro sofreu importante reforma com a ampliação do lado esquerdo para abrigar o sepulcro de Santo Domingo.
O sepulcro foi desenhado por Vigarny e realizado em 1513 por Juan de Rasines, com vários estilos: românico, gótico e pós-gótico. A igreja está organizada como uma típica igreja de peregrinação (como a maioria dos modelos ao longo do Caminho), com várias capelas e a existência de passagem próxima ao altar, o que permite a circulação.
Entre outros detalhes, destaca um nicho em lembrança ao peregrino enforcado injustamente e mantêm vivos numa gaiola um galo e uma galinha para celebrar a tradição e o milagre da “ressuscitação” para manifestar a inocência do peregrino.
Conta-se que a filha do dono da hospedaria do pueblo enamorou-se de um peregrino alemão, que estava acompanhado dos pais. Porém, como ele a desprezou, a jovem mentiu ao corregedor, acusando-o de furtar um cálice de prata. O peregrino foi condenado e enforcado (mas, Santiago o teria suspenso para não morrer sufocado). Ao ver o filho, os pais constataram que ele estava vivo, o que se devia à pronta ajuda do famoso hospitaleiro do lugar, Domingo, que cuidava de peregrinos. Os pais foram então ao corregedor contar a novidade e a autoridade, que estava numa mesa saboreando penosas assadas, zombou, dizendo que o peregrino estava tão vivo quanto elas. Não é que, embora assadas, as galinhas voltaram à vida!!!
Pois é esse milagre, ou mera lenda, que a cidade propaga com seriedade e o utiliza para atrair fiéis, turistas e peregrinos. A marca do santo com a galinha e o galo está no artesanato, na divulgação oficial etc. Além disso, é muito curioso ouvir o galo cantar dentro da igreja, especialmente durante as missas.
No domingo, logo após a celebração de Corpus Christi, houve uma concorrida procissão, tendo à frente crianças, meninos e meninas, senhores e senhores da sociedade calceatense e o pároco, que num determinado ponto da rua, sobre um dos tapetes, fez uma homilia.
Além de seus 900 anos de história, com riquíssimo patrimônio arquitetônico preservado e ainda a preservar, Santo Domingo de la Calzada explora com toda fé possível o santo de seu nome.
Nesse caldeirão de religiosidade católica e valioso patrimônio arquitetônico, lamenta-se o reduzido vestígio dos 800 anos de dominação árabe na Península Ibérica, ainda mais quando se sabe que a maioria das igrejas e catedrais de hoje teria sido erguida sobre mesquitas destruídas...

Nenhum comentário:

Postar um comentário