Texto abaixo foi escrito há 10 anos...
De trem não
é a melhor forma do peregrino chegar a Santiago de Compostela. Mas para mim
esta foi a alternativa possível de reencontrar a magnífica Santiago de
Compostela, após fazer a peregrinação pelo Caminho Aragonês, de Somport a
Puente la Reina – pelas minhas contas, cerca de 190 quilômetros a pé. E apenas
até Puente la Reina, pois a partir daí, ou melhor um pouco antes, em Obanos, o
Caminho Aragonês se une ao Caminho Francês. E foi exatamente o Caminho Francês
que inaugurou, em 2009, a série de minhas peregrinações pelos Caminhos de
Santiago. Naquela oportunidade, iniciei o Caminho Francês em Saint Jean Pied de
Port e peregrinei em torno de 800 quilômetros a pé nos meses de junho/julho, o
que está relatado no primeiro volume da trilogia “Pedras do Caminho”.
Por já ter
feito o Caminho Francês, e talvez nem tanto por isso..., afinal, penso em fazê-lo
outra vez... mas, pelo fato de ter pouco tempo de férias, não teria condições
de continuar a peregrinação pelo Caminho Francês por mais de 600 quilômetros e
seguir a pé até Santiago de Compostela.
Além do
mais, assim é o Caminho Aragonês: apenas um trecho, em torno de 165 quilômetros
– embora no meu caso dei uma ampliada e desviei por uma rota tangencial que
leva aos Monastérios de San Juan de la Peña... Como foi possível acompanhar, o
Caminho Aragonês atravessa os Pirineus, desde Somport, na divisa com a França,
para encontrar em Obanos a rota mais famosa a Santiago de Compostela. A
travessia dos Pirineus o coloca ao lado do Caminho Francês e, além da beleza da
paisagem, é reconhecida a grande importância que sempre teve na condução de
peregrinos por aquela região do Aragão, fosse para Santiago de Compostela,
fosse para o trabalho contínuo de evangelização e domínio espanhol em outros
pontos da Península Ibérica, na guerra contra os muçulmanos.
Não pensava,
contudo, que para um peregrino fosse tão decepcionante adotar outro meio, que
não os próprios pés, para ir ao encontro de Santiago. Uma decepção, certamente,
que não me contagiou naquele momento, nem deixei que me contagiasse, pois o
Caminho Aragonês é fantástico, proporciona experiências únicas e eternas... e,
afinal, estava agora em Santiago de Compostela.
Na verdade,
não importa se cheguei a pé, a cavalo, de bicicleta, de ônibus, trem ou avião,
pois sempre defendi, como peregrino, o respeito a todos os peregrinos que
chegam a Santiago por qualquer meio. Como, então, iria me martirizar por ter
chegado de trem, e ainda mais, depois de ter peregrinado o fantástico Caminho
Aragonês?
Cheguei a
Santiago no início da noite de 10 de junho, sob uma fina garoa e me instalei
num hotel junto ao casco antigo, já pensando no dia seguinte, em adentrar a
Catedral, rever e tocar o Pórtico da Glória, dar um forte abraço na cabeça da
imagem de Santiago, por trás do altar-mor, agradecer e orar junto às relíquias
do Apóstolo de Cristo, na cripta, confessar, comungar, participar na missa do
peregrino e, enfim, vibrar com o espetáculo do botafumeiro!
Fotos,
filmes, registrei detalhes da Catedral que não percebi nas duas outras vezes
que lá estive, em 2009, ao final do Caminho Francês, e em 2010, Ano Santo, após
completar o Caminho Português, desde Oporto. Quantos detalhes! Quantos ainda
verei nas próximas vezes em que retornar a Santiago.
Após algumas
horas, depois de entrar e sair várias vezes da Catedral, experimentando as
várias portas, subindo e descendo as escadarias, sempre sob uma fina garoa,
aproveitei para me deliciar com a culinária galega e segui, finalmente, para
conhecer a Cidade da Cultura. Fiquei deslumbrado com a concepção e a
construção, que já tinha visto num especial de tevê no Brasil, e me motivei a
escrever reportagem, capa na edição de junho de 2012 no Jornal Perspectiva,
disponível no site www.jornalperspectiva.com.br
Estava
programado para ficar mais um dia em Santiago de Compostela – antes de partir
para Santander, para descansar na casa dos amigos José Antonio Soto Rojas e Luz
Maria, e compartilhar também com o filho José Antonio Soto Conde, que havia
passado lua de mel no Brasil, em 2011, com a esposa Maria Angeles, e estavam
comemorando o primeiro aniversário da filha Sofia.
No dia
seguinte, terceiro e último dia em Santiago de Compostela, voltei a caminhar
pelas ruas de pedra, fui à nova Oficina de Peregrinos, para colocar o selo em
minha credencial que comprova o Caminho Aragonês. Embora não tivesse o direito
de obter mais uma Compostelana, como nas vezes em que completei o Caminho em
Santiago de Compostela, fiz questão de colocar o selo, pois, afinal, registra
minha passagem por Santiago.
Após a
missa, pela primeira vez, fui conhecer o Museu da Catedral, o claustro, o
Panteão Real, a Biblioteca, onde está uma réplica do botafumeiro e onde, até
aquela data, uma réplica do Codex Calixtinus ocupava o lugar do exemplar
original, que havia sido furtado e, até então, continuava desaparecido – mas
que viria a ser encontrado dias depois, no início de julho, na garagem na casa
de um ex-funcionário da Catedral.
Quantos
detalhes! Quantos ainda verei nas viagens futuras a Santiago.
Ah! Da
próxima vez chegarei a pé!
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